Powered By Blogger

sábado, 24 de setembro de 2011

Burocracia emperra a pedagogia

Neiff Satte Alam



“A REPROVAÇÃO de 79 mil crianças de 6 anos no primeiro ano do ensino -ou 3,5% dos inscritos na série em 2008- não chega a ser preocupante, mas traz um alerta. O fenômeno sugere que em algumas localidades a extensão do ensino fundamental para nove anos pode ter sido mal compreendida como obrigatoriedade de alfabetizar um ano antes do que se devia fazer até então, aos 7.”

Se já era preocupante o fato de ampliar o Ensino Fundamental de “baixo para cima”, isto é, substituir o último pré-escolar pelo primeiro ano, dando a falsa idéia de que houve um aumento para nove anos desta etapa do Ensino Básica, mais preocupante ficou na interpretação do Editorial da Folha de São Paula, pois fica claro que teria ocorrido apenas uma alteração “burocrática” e não pedagógica.

No entanto, está correto em afirmar que, na média brasileira, a expectativa de alfabetização aos seis anos seria um erro, pois estaria ainda, em sua grande maioria, em um estado pré-operatório onde se observa que a criança “é egocêntrica, centrada em si mesma, e não consegue se colocar, abstratamente, no lugar do outra; não aceita a idéia do acaso e tudo deve ter uma explicação (é fase dos "por quês"); já pode agir por simulação, "como se"; possui percepção global sem discriminar detalhe; deixa se levar pela aparência sem relacionar fatos.”

Somente no estado seguinte, o operatório-concreto , um dos estados de desenvolvimento a partir dos 7 anos, segundo Piaget e, conforme Nitzke et alli (1997b), neste estágio a criança desenvolve noções de tempo, espaço, velocidade, ordem, casualidade, ..., sendo então capaz de relacionar diferentes aspectos e abstrair dados da realidade. Apesar de não se limitar mais a uma representação imediata, depende do mundo concreto para abstrair.

Fica, então, fácil se concluir que a nona série (agora denominado ano) do Ensino Fundamental teria que ser inserida após a oitava e não antes da primeira, como está ocorrendo, pois acelera o risco de aumento de dificuldades na alfabetização da maioria das crianças. Mais adequado seria a oficialização dos pré-escolares dentro do Ensino Básico, com todas as vantagens constitucionais, impedindo que a evolução cognitiva natural de uma criança seja atropelada pelo artificialismo de uma decisão de gabinete.

Não excluímos a possibilidade de crianças sejam alfabetizadas, sem pressão, com idades inferiores (5 ou 6 anos), mas que sejam consideradas exceções e não situações extensivas aos demais como expectativa normal.

Ainda há tempo de correção, bastaria um pouco de humildade para o reconhecimento desta necessária mudança de rumo, sem artificialismo de encobrimento do erro, mas aproveitando-se do erro para, com criatividade e muita imaginação, “colocar o trem da educação nos trilhos”.