Powered By Blogger

sexta-feira, 11 de março de 2011

Decretos do Desespero

Profª. M. Alice Maria Souza Szezepanski


MEC sugere não reprovar aluno nos três primeiros anos do Fundamental: tenho pensado tanto neste tema que por vezes me vejo sem saber se estou emburrecendo ou se a aflição das pessoas em opinar faz com que digam a mesma coisa com palavras diferentes.
Ah! as palavras, quantos significados ganham para agradar quem as usa... só não podemos esquecer que para utilizá-las é preciso muita responsabilidade, principalmente para formadores de opinião.
Felizmente encontro alento em autores que tem tranquilidade opinativa (foi à expressão mais aproximada que encontrei para descrever minhas sensações). Significa aquela idéia passada por convicção autorizada pelo conhecimento do tema, sem arrogância. É o texto que não busca adeptos e seguidores pelo simples fato de é preciso que concordem com o autor e, tampouco, tem o tom raivoso de quem trata a história de forma leviana utilizando chavões e palavras de ordem (que sempre existirão, mesmo que sejam outras) inapropriadas para o momento da Escola brasileira.
Somado a isso e pior que isso é a invasão de conceitos e pensadores que se manifesta na desenvoltura com que são citados como parceiros de ideias que nem são deles, sabe aquelas do tipo: Freud explica isso quando diz...
Retomo dizendo que pelas minhas vivências na Escola, pelas experiências que fizeram e fazem parte da minha vida há vinte e cinco anos, tenho sido impelida a me preocupar com as instituições formadoras, seus currículos e, principalmente, suas relações de aprendizagens. Esclareço que não é uma avaliação voltada somente aos apelidados cursos de garagem, mas com as instituições reconhecidamente formadoras de licenciados e seus cursos de licenciaturas (ficou repetitivo, mas foi propositalmente).
Podem pensar o que isso tem a ver com a sugestão do CNE (Conselho Nacional de Educação) e do MEC (Ministério da Educação), em minha opinião muito, porque é uma tarefa difícil trabalhar na escola quando os professores não conseguem entendê-la como espaço de relações, de conhecimento, de gente.
Chegam muitos professores capazes nas Escolas, mas por vezes vêem seu trabalho desvalorizado porque têm que assistir atônitos a chegada de matemáticos, não professores de matemática; de pessoas “formadas” em literatura que não gostam de ler e não lêem pelos mais diferentes motivos ou desculpas; músicos (frustrados por não terem inventado o “rebolation” antes e ficado ricos), não professores de música... e assim a “nave vai” construindo (?) saberes desconectados, desinteressantes, inúteis, violência (principalmente do olhar e das escolhas docentes), dentre outros tantos tropeços, cumprindo um currículo traçado, nunca se sabe por quem, de forma linear pelo medo de ousar porque isso requer conhecimento.
Admiro muitos dos meus colegas em todos os níveis de ensino em que atuam, mesmo que não concorde com alguns, reconheço o esforço que fazemos e a preocupação que temos com nossos alunos e com a qualidade do nosso trabalho; minha fala não é pessimista e muito menos derrotista, tenho orgulho da minha profissão, mas a ação daqueles que não são comprometidos comprometem o trabalho de todos. Ressalto que a incapacidade para sala de aula não se limita aos “professores pó de giz”, como alguns leitores de orelha e rodapé a nós professores das Escolas, mas se estende para aqueles que atormentados pelas exigências do mercado educacional vigente produzem textos e textos e textos, porque tem que teorizar, tem que pesquisar para poder pontuar a instituição - não entendam que sou contra a pesquisa, ao contrário, só quero que seja relevante... o que e para que, é importante para a sociedade, faz diferença?, perguntinhas básicas.
Fico com a sensação de que temos uma sequência de quantificações sem produção inteligente. Pontua-se pela produção científica, que não significa atuação em sala de aula, porque temos que conseguir notoriedade e investimento; pontua-se a escola que tem melhor IDEB, que nem sempre significa conhecimento necessário para ser cidadão, que coloca o país inteiro dentro de um modelo, mas temos que alcançar os níveis internacionais para termos mais investimento... e a “nave vai”...
Assim, com este quadro vivemos dos, como chamo, “decretos do desespero”, portarias, resoluções, sugestões... para que possamos melhorar nossos índices internacionais, para que possamos dizer “estamos fazendo alguma coisa”, para que possamos amenizar o resultado das sucessivas propostas sem concretização, minimizar o desrespeito com a sociedade que paga, e muito, por uma escola de qualidade (cuidado ao utilizar esta palavra) e disfarça a fala inapropriada dos gestores que tratam Educação como “gasto” e não como “investimento”.
Todas essas considerações que podem ser desdobradas em outras tantas discussões e novas considerações me remetem a necessidade de escolhas e propostas éticas, fundamentadas, brasileiras, gaúchas, paulistas, cariocas, baianas, goianas... que aprovarão nossos alunos ou os reprovarão sem culpa ou disfarces, pois errar e acertar, ganhar e perder, vencer e perder faz parte da vida e é nela que a Escola está.
Pergunto-me e pergunto: será que tantos professores que só querem saber o dia da folga, que só reclamam que ganham pouco (e ganhamos, mas essa é outra discussão), que não estudam que não gostam de gente conseguiriam cursar e concluir um curso de licenciatura se percebessem a dimensão humana e intelectual que o trabalho exige?
Caso sigamos a sugestão do CNE espero que seja com responsabilidade, cientes de que esta mudança requer mudanças, exige desconstruções, humildade para errar e aprender. Que toda essa discussão nos leve a aprender que lidar com a frustração de que não podemos resolver tudo na Escola não é defeito, é humano, mas que tudo seja feito com serenidade e ética.
Portarias, resoluções, normativas, orientações, sugestões... aprovação, reprovação, seriação, ciclos, progressão, nota, parecer, alunos sentados em fila, alunos sentados em círculo... tudo vale à pena se a intenção não for pequena.