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sábado, 12 de novembro de 2011

“Caim”, de Saramago

Neiff Satte Alam



Brincando com o tempo e colocando Caim no lombo de um jegue, Saramago faz uma interessante leitura do Velho Testamento. De fratricida a herói, como se fosse uma releitura das relações entre Dr.Frankenstein e sua criatura, Caim circula pelo tempo desafiando o Criador.

Imortal e atemporal, ele e seu jegue, avançam e recuam no tempo sempre dentro dos principais acontecimentos registrados no Velho Testamento. Foi ele, Caim, que na cena em que Abraão vai sacrificar seu filho Isaac a pedido de Deus, interferiu para que tal crime não ocorresse: “.... Então por que quiseste cortar-me a garganta como se eu fosse um borrego, perguntou Isaac, se não tivesse aparecido aquele homem para segurar-te o braço, estarias agora a levar um cadáver para casa.” Esta é uma pequena demonstração da aventura literária sobre um Caim aventureiro, nem bom, nem mau, apenas um emissário imortal que desafiou o Criador a quem culpa pela sua sorte, pois sempre entendeu Caim, segundo Saramago, que desde a ruptura de seus pais, Adão e Eva, com Deus até todos os desastres que atingiram a humanidade, a responsabilidade primeira seria Dele, que tudo pode!

O livro tem momentos de humor refinado e transcrição de cenas eróticas onde Caim é sempre o ator principal.

Como as viagens no tempo não eram somente em um sentido, em vários momentos o nosso personagem se viu no passado de um futuro já visitado. Assistiu a queda das muralhas de Jericó; construção e destruição da Torre de Babel, finalmente encontra-se com Noé e sua família, auxilia na construção da arca, assim como vários anjos. As relações entre Caim e os membros da família de Noé se constitui em uma trama de sexo e assassinatos que nos permite interpretar estas últimas cenas como uma transposição da realidade contemporânea para todo o caos imaginado pelo autor. Caim, o da história de Saramago, é a própria humanidade. Finalmente destrói toda a obra do Senhor Deus, pois, matando Noé e toda sua família, fica só e discutindo com o Criador:”...Depois Caim disse, agora já podes matar-me. Não posso, palavra de Deus não volta atrás, morrerás da tua natural morte na terra abandonada e as aves de rapina virão devorar-te a carne.” “...Sim, disse Caim, depois de Tu primeiro me haveres devorado o espírito.” A resposta de Deus não chegou a ser ouvida, também a fala seguinte de Caim se perdeu, o mais natural é que tenham argumentado um contra o outro uma vez e muitas, a única coisa que se sabe de ciência certa é que continuaram a discutir e que a discutir estão ainda...”

Querem saber mais desta aventura literária e, mais importante, interpretá-la ao sabor de sua vontade, como fez Saramago com o Velho Testamento? Leiam o livro e continuem a discussão, sem medo e sem tempo...