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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Limpeza da vidraça


Neiff Satte Alam

            As piadas têm, em geral, uma mensagem que atingem as pessoas de forma diferente. Algumas riem da piada, outras se questionam e muitos sequer entendem o próprio enquadramento no contexto da piada. Tem uma que fala de um casal que estava tomando café e, através das vidraças, visualizavam o quintal da vizinha. Os lençóis estendidos no varal fizeram o comentário da manhã, pois a esposa chamou a atenção do marido para a sujeira dos lençóis. Este observou e, sem nada dizer, terminou sua refeição matutina em silêncio. Nos próximos dias a cena se repetiu, sempre a mesma observação da mulher e o mesmo silêncio do marido. Incomodado com a situação, o marido se levantou, pegou delicadamente a esposa pelo braço, levou-a até a vidraça e disse: “- Os lençóis da vizinha estão impecavelmente limpos, assim como as toalhas e as camisas, o que necessita de limpeza são os vidros da janela de nossa cozinha.”
            Lembrei-me desta piada ao ler manifestações de defesa da floresta Amazônica ao ser devastada por grileiros, assentados, nacionais e multinacionais. Um Bioma fantástico, de enorme biodiversidade – talvez a maior do Planeta, mas que vai se destruindo gradativamente. Perfeita a observação do autor do artigo em defesa deste ambiente.
            Provavelmente o mesmo autor esteja com os vidros dos óculos, se é que os necessita, empoeirados quando não percebe a mesma destruição do Bioma Pampa, também de riquíssima biodiversidade. Ambos os Biomas, Pampa e Floresta Amazônica, são tão importantes à manutenção saudável e equilibrada das populações humanas aí inseridas,   que os desequilíbrios provocados por suas destruições trarão danos irreversíveis até a própria economia destas regiões que são o alvo destas paradoxais salvações sócio-  econômicas que, pretensiosamente, parecem ser os objetivos dos que plantam lavouras de soja nas zonas desmatadas e lavouras de árvores no Pampa gaúcho e uruguaio. É de lá, do Uruguai que vêm um dos mais importantes alertas sobre esta situação (Correio Braziliense):           “...O Movimento de Agricultores Rurais de Mercedes, que reúne cerca de 150 produtores, já negocia com o governo uma pauta de reivindicações, onde exigem que nenhum eucalipto mais seja plantado, a desativação da fábrica de celulose, a solução dos problemas de água nas terras dos vizinhos das florestas e a revisão da legislação ambiental, que não impõem limites nem restrições à atuação das multinacionais do setor”. Vejam bem, lá não é muito diferente daqui, segue a notícia. “... A região sofre com a falta de água. Mesmo proprietários rurais  arrendaram terras para as multinacionais pressionam o governo para resolver o problema, mas não falam abertamente sobre o assunto. Dezenas de agricultores já deixaram a localidade, ou porque venderam suas terras ou porque não conseguem mais uma boa produtividade. A despesa com a operação de bombas d’água encarece o custo de produção. A escola mantida pela intendência de Mercedes contava com 60 alunos há poucos anos. Hoje, não passam de 20. Encontramos várias casas abandonadas perto da estrada que margeia as florestas da Florestal Oriental e da Eu Flores, que abastecem as multinacionais”.
            Bem, como diz a piada, talvez tenhamos que lavar nossas vidraças antes de somente ver lá fora, distante, os problemas que na verdade estão em nossa casa, no nosso quintal e logo na nossa cozinha quando começar a falta de água, comida e condições mais dignas de vida.