Neiff Satte Alam
É dura esta
vida de Papai Noel. Início de inverno, uma neve gostosa, a lareira funcionando
e estalando com esta lenha ardendo e tenho que subir neste trenó ridículo, com
renas que não estão nem um pouquinho satisfeitas de terem que sair voando por
este mundo a fora.
Querem saber
mais de meus problemas?
Bem, os meus
assistentes para o Brasil e o resto da América do Sul entraram em greve, dizem
que, se não receberem hora extra em dobro para trabalhar na noite de Natal, não
movimentam um dedo para a distribuição de presentes; tem ainda a insalubridade
e periculosidade, pois sobrevoar a área dominada pelas FARC é um risco
permanente, somente no ano passado cinco trenós foram abatidos por serem
confundidos com aeronaves do governo; ainda há o enorme risco de descerem
chaminés estreitas, alguns assessores ficaram trancados por vários meses em
chaminés de lareiras que nem são utilizadas, pois, em razão do clima de algumas
regiões do Brasil e de outros países da América do Sul, servem apenas como
enfeite; um trenó desceu equivocadamente no Estádio do Morumbi, em São Paulo , a roubalheira
num jogo era tamanha que roubaram as renas e todos os presentes e o seguro não
foi pago até hoje.
Não adianta
reclamar, tenho mesmo que por esta roupa
vermelha com pele branca e este gorro bicudo com um pompom na ponta, ensaiar aquela risada característica –
HO HO HO, atrelar as renas especiais e sair voando por aí.
A chegada no
Brasil foi um problema, pois a temperatura de mais de 35 graus me desidratou e
tive que ficar um dia inteiro por conta do SUS em uma cidadezinha do Piauí e as
renas foram apreendidas pelo IBAMA, até que provasse que Papai Noel existia e
que não era São Nicolau, tive ameaça de prisão, mas não me livrei de um
pagamento efetivo de multa por maltrato de animais e por contrabando de
brinquedos.
Dois dias
depois fui interceptado pelo pessoal do Conselho da Criança e do Adolescente e
tive que dar explicações sobre a discriminação na hora de dar os presentes,
pois algumas crianças recebem presentes mais caros, outras mais baratos e
muitas sequer recebem. Fui obrigado a dar uma aula de neoliberalismo,
globalização, capitalismo, socialismo, escotismo, política e até de ufologia,
pois como explicar minhas aparições simultâneas em milhares de lares em uma
única noite? Claro que isto não expliquei, faz parte do segredo profissional do
Papai Noel.
De qualquer
maneira, pretendo cumprir meu papel, mesmo que muitos pais fiquem dizendo às
criancinhas que não existo. Se eu não existisse, como as lojas venderiam tantos
brinquedos? Como existiriam tantos imitadores (horríveis, diga-se de passagem)
espalhados pelo mundo? Papai Noel existe, sim! Alguns são bem aquinhoados,
muitos assalariados, muitos desempregados, mas existe. Não usam roupa vermelha
com peles brancas, não possuem trenó com renas, não entram pelas chaminés das
casas, mas, como o Papai Noel desta história, têm enormes dificuldades para
finalmente colocarem os presentes possíveis junto a cama dos pequeninos para
que a ilusão do Natal não se perca, mas que fique gravada como um grande amor
dos pais pelos filhos, mesmo tendo que enfrentar as maiores adversidades. Este
foi o grande segredo que o Papai Noel não quis revelar: como chegar a todos os
lares na mesma noite? Realmente Papai Noel existe, você se encontra com ele
todos os dias do ano!